Sabem o que é a curva loxodrómica?
Fui no sábado ver a exposição que está na Biblioteca Nacional , intitulada "Conta, Peso e Medida. A ordem matemática e a descrição física do mundo", cujo catálogo, também disponível se chama "O Livro Científico dos Séculos XV e XVI". Foi uma visita magnífica guiada pelo Prof. Henrique Leitão, investigador de História da Ciência.
Houve cerca de dois anos e meio de investigação dos fundos científicos antigos da BN, em que se examinaram sistematicamente cerca de 5000 livros, tendo sido seleccionados cerca de 1000 possíveis de serem aqui expostos, dos quais podemos apreciar 140. Alguns são obras originais, raras e valiosíssimas, que é um verdadeiro privilégio poder observar ao vivo. Vi, por exemplo a primeira edição dos Elementos de Euclides,
de 1482, um livro com uma apresentação gráfica belíssima, já com muitas gravuras apesar de ter sido editado pouco tempo depois de inventada a tipografia (em 1455 Gutenberg termina a primeira impressão tipográfica).
Pude ver também a segunda edição do livro "De Revolutionibus" de Copérnico de 1566,
"Almagesto" de Ptolomeu, a primeira edição impressa das obras de Arquimedes, as primeiras edições impressas de Boécio, de Vitelio, de Tartaglia e as de vários autores portugueses, como Pedro Nunes.
É a primeira vez que em Portugal se mostra um conjunto de livros científicos tão importante como este, que testemunha a existência de uma história cultural e científica muito importante em Portugal.
A estrutura da mostra divide-se em oito áreas: Euclides e os Elementos de Geometria; Astronomia e ordem do mundo; Matemática e o mundo físico; Aritmética e álgebra; Autores portugueses; Tecnologia e aplicações; Instrumentos matemáticos e científicos e Filosofia natural e tradição enciclopédica.
Quase todos os livros expostos são de Matemática.
O que mais me chamou a atenção foi a obra de Pedro Nunes (1502-1579).
Na navegação do século XVI obrigava-se o navio a seguir na superfície do mar uma trajectória tal que o ângulo da direcção do movimento com o meridiano se conservasse constante. A esta curva dava-se então o nome de linha do rumo e dá-se hoje o nome de loxodromia. A direcção do meridiano era dada aproximadamente pela agulha magnética da bússola.
Julgavam os pilotos e estava mesmo escrito na Arte de marear de Faleiro que as linhas de rumo coincidem com círculos máximos da Esfera terrestre.
Ora, o cosmógrafo real Pedro Nunes mostrou que as linhas de rumo são geralmente espirais esféricas que dão um número infinito de voltas à roda dos Polos da Terra e que as únicas linhas de rumo circulares são os meridianos e os paralelos, que correspondem evidentemente aos ângulos de rumo de zero e de noventa graus.
A distância mínima a percorrer por um barco entre dois pontos da Terra não é uma linha recta, mas um arco, a loxodrómica.
Isto pode parecer simples e evidente, mas demorou muito tempo a que os navegadores o entendessem. O primeiro a percebê-lo em toda a sua extensão foi o nosso Pedro Nunes.
Ao descobrir a linha de rumo, Pedro Nunes provou também que um barco que, hipoteticamente, num planeta completamente coberto de água, seguisse sempre uma mesma direcção cardeal, acabaria por não regressar ao mesmo lugar, como na altura se pensava, mas seguiria uma espiral infinita, aproximando-se de um dos pólos, mas nunca o alcançando.
O nosso matemático teve a intuição de que os antigos mapas portulanos tinham de ser refeitos, mas foi Gerardus Mercator (1512-1594) quem haveria de originar uma revolução em cartografia, com base na descoberta de Pedro Nunes.
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