O artigo cesto

Acho uma delícia esta expressão. Não a conhecia. Li-a no outro dia nos jornais. Parece que é usada pelos advogados. E que lhes pode dar chatices. Sobretudo se a usam para desafiar juizes. Que os juízes são intocáveis! Podem adiar as suas decisões indefinidamente, que ninguém se pode impacientar com isso. A vida deles não depende dessas decisões que adiam! Os outros são ralé! Que esperem. Ai do comum dos mortais se tem a sua vida dependente duma decisão judicial! Recorrer à justiça, por vezes atrapalha mais do que ficar na situação de injustiçado.

Mas é libertador haver um artigo cesto. Permite-nos livrarmo-nos de tudo o que nos importuna. Tira-nos um peso dos ombros. Já viram que é tão fácil. Basta deitar fora. O que nos pressiona. O que nos pesa na consciência. Uma tarefa que não temos tempo de cumprir, uma amizade que não sabemos corresponder...

"Futuro das Humanidades em Portugal e Cidadania Europeia".

Por se tratar de um texto importante para o debate no Que Universidade, e por ser um assunto que também me interessa, aqui deixo o texto publicado no Expresso de 29 de Maio.

Tudo o que é aqui dito se aplica a outros ramos do conhecimento, por exemplo à matemática. Ou seja, é lamentável que cada nova reforma vá baixando o nível do ensino praticado no Secundário, deixando ao Superior a tarefa de leccionar "num modelo de iniciação, saberes que lhe não competem porque não ministrados em tempo útil".

Passeio dominical

Hoje, como de costume, fui fazer a minha caminhada habitual de domingo de manhã.
No passeio largo, rente ao mar, na zona de Estoril, Cascais.
Cerca de uma hora e meia em passo rápido, apreciando o agradável odor a maresia, os cafés e esplanadas ao longo do passeio, que começam a abrir e que convidam a ficar ali, horas, a preguiçar... Em Cascais, àquela hora matinal só se ouviam os pássaros, bandos de andorinhas cruzavam-se aos guinchos, por cima das nossas cabeças. Há mesmo junto à agua umas casas baixinhas, como se fosse uma pequena aldeia escondida atrás dos novos edifícios, onde crescem enormes bungavílias rosa vivo.
Deixo-vos estas fotos para apreciarem... é claro que não tem o azul das Grenadines, mas é a prata da casa...

A música e a matemática e outras interdiciplinaridades

Hoje fui ao concerto de encerramento do ano lectivo do Instituto Politécnico de Lisboa, que teve lugar na Sociedade de Geografia de Lisboa.
Ao ler no programa, o vasto curriculum, do Maestro, Vasco Pearce de Azevedo, reparei que além duma vastíssima actividade no campo da música, ele é licenciado em Engenharia Electrotécnica e foi assistente das disciplinas de Álgebra e Análise Matemática no Instituto Superior Técnico.
- Um colega, exclamei! Mais uma vez constato a relação entre a matemática e a música. Não é a primeira, nem a segunda pessoa que eu conheço, que fizeram os dois percursos paralelos. Curioso, a quantidade de pessoas para quem a música e a matemática são igualmente belas e fundamentais.
Já lá vai o tempo em que eram estanques os vários ramos do conhecimento.
Está a surgir uma grande interdisciplinaridade.
No início do século 20, o físico Rutherford afirmou, que “all Science is either Physics or stamp collecting”, actualmente é possível encontrar num mesmo seminário, físicos teóricos a estudar neurofisiologia para construir modelos matemáticos (redes neuronais) que expliquem os mecanismos da memória; matemáticos que trabalham com químicos para estudar as equações da reacção de Belousov-Zhabotinskii; engenheiros que estudam a possibilidade de caos no escoamento do fluido de arrefecimento de uma central nuclear; astrónomos que aplicam ideias da Física da Matéria Condensada ao estudo do Sistema Solar; economistas a usar ténicas de redes neuronais em problemas clássicos de Economia e Gestão, etc.

Link com link se paga

Em tempos referi aqui e agradeci os links que tiveram a graça de me fazer.
Claro que não fui exautiva. Por isso, aqui deixo os meus agradecimentos a dois que recentemente encontrei: Forum Comunitário e Outro Olhar.
Provavelmente haverá outros, que por ora me escapam...

Elitismo e ética na universidade

Ontem, depois de ter lido o post de Professorices, a propósito de elites e de ética na Universidade, (nem de propósito!) veio-me parar às mãos o filme “A culpa humana”.
Vi o filme em casa e recomendo. É realmente muito teórico falar do papel das supostas elites, quando na prática, se vê a intolerância e a inveja como motivações básicas.
Trata-se de “THE HUMAN STAIN”, escrito por Philip Roth.
É a história dum reitor, Coleman Silk, distinto professor da área de Humanidades que consegue elevar bastante o nível da Universidade onde trabalha, New England, mas que, talvez por isso, cria um círculo de inimizades que o vai prejudicar. Assim, aproveitando um simples comentário que faz a um aluno que falta regularmente, e que ele nem sequer conhece, os seus pares acusam-no de racismo e ele tem de resignar. O mais curioso é que ele próprio é de raça negra, mas toda a vida escondeu esse facto. Para não ter de se desmascarar, ele aceita ser despedido sem nada revelar. Sofre a injustiça, vítima da inveja dos seus colegas, professores na universidade, tantos deles admitidos e ajudados por ele.
É de admirar o excelente desempenho de Nicole Kidman, a sua paixão de 34 anos e Anthony Hopkins, o professor de 71 anos. O filme é de 2003.

Estatutos da Carreira Docente serão aprovados sem negociação

Realizou-se em 26 de Maio de 2004, o debate mensal na Assembleia da República.

Num debate que anunciou centrar-se sobre a Ciência, Durão Barroso veio pela quarta vez proclamar o mesmo pacote financeiro que aprovou em Óbidos e cuja grandiosidade tem vindo a sofrer unânime desmontagem por parte da comunidade científica nacional. A Ciência e a Tecnologia, tão silenciadas no consulado de Pedro Lynce, estão agora a servir de factor publicitário, se não de publicidade enganosa.

O Primeiro-Ministro respondendo a uma questão suscitada por um deputado da maioria afirmou que os Estatutos de Carreira Docente do Ensino Superior já estão prontos e serão aprovados em próximo Conselho de Ministros.

Esta tentativa de aprovação dos Estatutos de Carreira sem que sejam negociados com as associações sindicais representativas dos docentes, contraria a Constituição e a Lei nº 23/98.

A ministra Graça de Carvalho, tinha garantido desde a tomada de posse, como o fez ainda este mês, que os Sindicatos seriam chamados para negociar os ECDES, o que constitui mais uma lamentável mistificação.

O Ponto

Mínimo sou,
Mas quando ao Nada empresto
A minha elementar realidade,
O Nada é só o resto.

(por Reinaldo Ferreira)

Limite

Pedra após pedra
cálculo após cálculo,
escalei exponenciais de base maior que um
como se não restasse já tempo algum.
E avancei desprotegida
para além do medo,
- assim me tornava destemida
a vontade de descobrir o segredo.
Naveguei em mares sem fim
sobre agitadas ondas de período 2pi .
Noite após noite
sem ajuda de ninguém,
da lua calculei o seno,
do seio a curva extrapolei,
estranhos sinais escutei de faróis de além,
imaginários números reais contei de uma outra margem,
e avancei,
ansiosa por desvendar o sentido oculto da mensagem.
Obscuras grutas explorei,
e de axioma em axioma
no encadeado de múltiplas razões me enredei,
da terra rasgando o mais profundo,
das mãos sangrando a demonstração do mundo,
de tudo extraindo a inumerável raiz,
dos números todos buscando a antiga matriz
à procura de um indefinível e raríssimo minério.
E avancei
avancei sempre,
tão forte era a vontade de decifrar esse mistério.
Sem máscara
sem arma
sem régua ou compasso,
avancei só
avancei passo a passo
dia após dia,
a rigorosa lógica amando menos
que a quente poesia.
Como uma criança assustada
que noite após noite conta sem parar
e adormece mais cansada
sem o último número alcançar,
a todos os perigos sobrevivi
de todas as solidões renasci,
e ao perigo da razia da razão resisti.

Mas para quê se pouco encontrei do que esperava encontrar ?
Para quê ?
- Talvez para compreender
que um limite não se alcança por acumulação de cálculos.

Um limite ... há que pressenti-lo de dentro
e num voo directo, mais rápido que o da Razão,
identificar sujeito e conhecimento,
como em qualquer sucessão.
-- Talvez para reconhecer,
que muito viajar e conquistar,
não é condição necessária para compreender.
Basta o que se é, ser,
olhar à volta e ver,
ou melhor ainda, ver sem olhar,
e sem chegar a partir, caminhar .
Desejar sem desejo
agir sem acção
beijar sem dar beijo
amar sem contradição;
mover-se e permanecer imóvel,
combater pela Verdade, pelo Primeiro Móvel,
sem algum lucro ambicionar,
e decididamente rejeitar o 'para mim'
- pois só se alcança o que se deseja
quando já nada se deseja alcançar enfim.
(LIMITE, de Luis Madureira)

Nó-sela e órbita homoclínica.

Hoje vou explicar resumidamente a razão deste nome. Scilicet, refere-se a um post meu anterior sobre as Equações de Lorenz, notando que formiga e ozono também falaram no assunto e apresenta mesmo as referidas equações. Assim perdi o receio de ser demasiado técnica e vou também desenvolver um pouco estes temas. Podemos considerar isto um pouco como a divulgação científica de que fala Holocénico.



A figura mostra um nó-sela, neste caso o ponto (0,0), donde parte uma variedade instável, que coincide com a variedade estável neste ponto, formando a órbita fechada T, que por essa razão se chama órbita homoclínica . Ou seja, T é um conjunto de pontos (p(t),p'(t)), tais que o limite quando t tende para menos infinito ou para mais infinito de (p(t),p'(t)), é o mesmo ponto (0,0).
Estamos a falar de soluções de equacões diferenciais.
Poincaré foi o primeiro a observar a importância dos pontos homoclínicos. Considerando uma secção transversal às variedades estável e instável dum certo ponto sela, as linhas determinadas nesta secção por aquelas variedades podem, sob o efeito duma pequena perturbação na equação diferencial com uma órbita homoclínica, cruzar-se transversalmente num ponto dito homoclínico transverso. Neste caso, intersectam-se infinitas vezes e, segundo Poincaré, (Les methodes nouvelles de la mécanique céleste, Gauthier-Villars, Paris, 1892-99, III, p.389), "tais intersecções formam uma espécie de trança de tecido, de rede com malhas infinitamente apertadas, não devendo nenhuma das duas curvas alguma vez cruzar-se, mas dobrar-se sobre si própria de modo muito complexo, de forma a encontrar uma infinidade de vezes todas as malhas da rede. Ficar-se-ia tão confuso com a complexidade da figura, que não tento sequer traçar". Ou seja, Poincará tinha descoberto o que hoje se designa por "caos".
É o que acontece, por exemplo, nas Equações de Lorenz.

Blogeando por aí...

encontrei coisas engraçadas, que gostaria de partilhar.
Do Ad Libitum tirei duas que gostei.
Um poema aos amigos, que aqui reproduzo:
Preciso de alguém
Que me olhe nos olhos quando falo.
Que ouça as minhas tristezas e neuroses com paciência.
E, ainda que as não compreenda, respeite os meus sentimentos.

Preciso de alguém, que venha lutar ao meu lado sem precisar ser convocado;
alguém amigo o suficiente para dizer-me as verdades que não quero ouvir,
mesmo sabendo que posso odiá-lo por isso.

Neste mundo de cépticos, preciso de alguém que acredite,
nessa coisa misteriosa, desacreditada, quase impossível:
a amizade.

Que teime em ser leal, simples e justo,
que não vá embora se algum dia eu perder o meu ouro
e não for mais a sensação da festa.

Preciso de um amigo que receba com gratidão o meu auxílio, a minha mão estendida.
Mesmo que isto seja muito pouco para suas necessidades.
Preciso de um amigo que também seja companheiro,
nas farras, nas noites, no surf, nas guerras e alegrias,
e que no meio da tempestade, grite em coro comigo:
"Nós ainda nos vamos rir muito disto tudo" e ria muito.

Não pude escolher aqueles que me trouxeram ao mundo, mas posso escolher meu amigo.
E nessa busca empenho a minha própria alma pois,
com uma amizade verdadeira, a vida se torna mais simples, mais rica e mais bela...

E eu tenho-vos a vocês.....meus amigos!!

Também eu sinto esta necessidade... de amizade... de lealdade...
o poeta? NL, um dos autores do Blog.

Outra com graça:
Para descontrair
Para quem tem pouco tempo para ler e perder tempo a ler milhares de páginas...

Leon Tolstoi -"GUERRA E PAZ" ( 1800 paginas ) resumo:
Um rapaz não quer ir à guerra e por isso Napoleão invade Moscovo.
A rapariga casa-se com outro.
FIM

Luís de Camões - "LUSIADAS" ( várias edições ) resumo:
Um poeta com insónias decide aborrecer o Rei e contar-lhe uma história de marinheiros que, depois de alguns problemas (logo resolvidos por uma deusa porreiraça), tem o justo premio numa ilha cheia de "gajas" boas.
FIM

Gustave Flaubert -"MADAME BOVARY" ( 378 paginas ) resumo:
Uma dona de casa engana o marido com o padeiro, o leiteiro, o carteiro, o homem do talho, o merceeiro e um vizinho cheio de massa. Envenena-se e morre.
FIM

William Shakespeare -"HAMLET" resumo:
Um príncipe com insónias passeia pelas muralhas do castelo, quando o fantasma do pai lhe diz que foi morto pelo tio que dorme com mãe, cujo homem de confiança é o pai da namorada que entretanto se suicida ao saber que o príncipe matou o seu pai para se vingar do tio que tinha matado o pai do seu namorado e dormia com a mãe. O príncipe mata o tio que dorme com a mãe, depois de falar com uma caveira e morre, assassinado pelo irmão da namorada, a mesma que era doida e que se tinha suicidado.
FIM

NOVO TESTAMENTO ( 4 versões ) resumo:
Uma mulher com insónias dá à luz um filho cujo pai é uma pomba, o filho cresce e abandona a carpintaria para formar uma seita de pescadores.
Por causa de um bufo, é preso e morre
FIM

Os blogs chegaram à Assembleia da República

Em República Digital, pode ver-se o blog de José de Magalhães. Em Julho de 2003 a Assembleia da República anunciou a criação de uma página pessoal ou blogue para cada deputado a fim de difundir a informação do exercício do seu mandato a para uma mais fácil interacção com os eleitores. Porém, este é o primeiro. Mas há um manual, um código de regras para fazer estes blogs, o já polémico "Livro de Estilo".

Alunos do Instituto Superior Técnico (IST) estão a inovar para a Ferrari e Porsche

Hoje no Público pode ler-se que há cerca de duas semanas, um grupo de jovens engenheiros portugueses partiu para Turim, para a sede da Pininfarina, onde começou a receber formação avançada na área da concepção e desenvolvimento de produto para trabalharem, de regresso a Portugal, provavelmente em plataformas para séries especiais da Ferrari e Porsche.

A Pininfarina desafiou os alunos do primeiro mestrado em engenharia de concepção do Instituto Superior Técnico (IST) a darem soluções inovadoras.

Além disso, no departamento de engenharia mecânica do IST, há alguns meses que um Peugeot 406 amarelo e uma carrinha Lancia K grená estacionaram à porta e se encontram parcialmente desmontados. Foram cedidos pela Pininfarina, que os desenhou, para que os alunos do mestrado em Engenharia de Concepção apresentassem, a partir de veículos reais, soluções inovadoras de materiais e tecnologias. A Pininfarina distribuiu mais oito veículos por instituições de Milão e Turim, com o mesmo objectivo.

Mas sabem, o que mais me atrai no Técnico? O perfume das tílias, nesta altura do ano, no pequeno jardim que fica próximo do edifício de pós-graduação. Irresistível!!!
Mas schiiuuu! Ninguém pode saber que os meus motivos são tão pouco...científicos!...

Poema para Galileo

Em 9 de Maio 2004 fez 21 anos que João Paulo II cancelou a condenação de Galileo, ocorrida em 1633. O Abrupto falou nisto e eu também. Por acaso hoje veio-me parar às mãos o poema do professor de física Rómulo de Carvalho (quem melhor que um físico para entender o que se passou com Galileo) e não resisti a reproduzir aqui o poema.

Poema para Galileo
Estou olhando o teu retrato, meu velho pisano,
aquele retrato que toda a gente conhece,
em que a tua bela cabeça desabrocha e floresce
sobre um modesto cabeção de pano.
Aquele retrato da Galeria dos Ofícios da tua velha Florença.
(Não, não, Galileu! Eu não disse Santo Ofício,
Disse Galeria dos Ofícios.)
Aquele retrato da Galeria dos Ofícios da requintada Florença.
Lembras-te? A Ponte Vecchio, a Loggia, a Piazza della Signoria...

Eu sei... Eu sei...
As margens doces do Arno às horas pardas da melancolia.
Ai que saudade, Galileo Galilei!

Olha. Sabes? Lá em Florença
está guardado um dedo da tua mão direita num relicário.
Palavra de honra que está!
As voltas que o mundo dá!
Se calhar até há gente que pensa
que entraste no calendário.

Eu queria agradecer-te, Galileo,
a inteligência das coisas que me deste.
Eu,
e quantos milhões de homens como eu
a quem tu esclareceste,
ia jurar - que disparate, Galileo!
- e jurava a pés juntos e apostava a cabeça
sem a menor hesitação -
que os corpos caem tanto mais depressa
quanto mais pesados são.
Pois não é evidente, Galileo?
Quem acredita que um penedo caia
com a mesma rapidez que um botão de camisa ou que um seixo de praia?

Era esta a inteligência que Deus nos deu.

Estava agora a lembrar-me, Galileo,
daquela cena em que tu estavas sentado num escabelo
e tinhas à tua frente
um friso de homens doutos, hirtos, de toga e de capelo
a olharem-te severamente.
Estavam todos a ralhar contigo,
que parecia impossível que um homem da tua idade
e da tua condição,
se estivesse a tornar num perigo
para a Humanidade
e para a Civilização.
Tu, embaraçado e comprometido, em silêncio mordiscavas os lábios,
e percorrias, cheio de piedade,
os rostos impenetráveis daquela fila de sábios.
Teus olhos habituados à observação dos satélites e das estrelas,
desceram lá das alturas
e poisaram, como aves aturdidas - parece-me que estou a vê-las -,
nas faces grávidas daquelas reverendíssimas criaturas-
E tu foste dizendo a tudo que sim, que sim senhor, que era tudo tal qual
conforme suas eminências desejavam,
e dirias que o Sol era quadrado e a Lua pentagonal
e que os astros bailavam e entoavam
à meia-noite louvores à harmonia universal.
E juraste que nunca mais repetirias
nem a ti mesmo, na própria intimidade do teu pensamento, livre e calma,
aquelas abomináveis heresias
que ensinavas e escrevias
para eterna perdição da tua alma.
Ai, Galileo!
Mal sabiam os teus doutos juízes, grandes senhores deste pequeno mundo,
que assim mesmo, empertigados nos seus cadeirões de braços,
andavam a correr e a rolar pelos espaços
à razão de trinta quilómetros por segundo.
Tu é que sabias, Galileo, Galilei.
Por isso eram teus olhos misericordiosos,
por isso era teu coração cheio de piedade,
piedade pelos homens que não precisam de sofrer, homens ditosos
a quem Deus dispensou de buscar a verdade.
Por isso estòicamente, mansamente,
resististe a todas as torturas,
a todas as angústias, a todos os contratempos,
enquanto eles, do alto inacessível das suas alturas,
foram caindo,
caindo,
caindo,
caindo,
caindo sempre
e sempre,
ininterruptamente,
na razão directa dos quadrados dos tempos.


de António Gedeão

Trackbacks

vou experimentar, seguindo as instruções de Professorices. Obrigada:))

Agradecimentos

Embora com tão pouco tempo de vida, este blog começou em 18 de Abril, ainda não tem um mês e já se vê citado em tantos!
Pela gentileza de me incluírem nos vossos links ou de me citarem, queria aqui deixar os meus agradecimentos, a:
A Formiga de Langton, Algarve Global, Holocénico, O Blog do Alex, Professorices, Que Universidade, Simplesmente Alex, Um Pouco Mais de Azul.

O Mistério da Educação

Já muito se disse e eu já desisti de pensar no que se poderia fazer para melhorar este estado de coisas. Mas já que Que Universidade e Um pouco mais de azul se referem ao artigo de António Barreto, sobre este assunto publicado no Público, vou resumir o que penso, sobretudo no que diz respeito à minha área.
Em primeiro lugar, penso que o Ministério da Educação é um monstro velho, cheio de manhas, estático e quase impossível de governar. Tenho assistido ao longo dos anos a pessoas que chegam lá cheias de entusiasmo, confiantes que têm a fórmula mágica para pôr as coisas a funcionar bem e saem de lá queimadas. Mudaram tudo, viraram os programas do avesso, mas continua tudo mal, ou pior! Por isso, eu também não tenho a solução.
Na área que me toca, a matemática, posso só dar algumas achegas. A verdade é que os alunos que chegam ao 1º ano da faculdade vêm cada vez mais impreparados. Ainda ontem a corrigir testes, vi um que aluno não sabia resolver uma equação do 2º grau, numa cadeira do 2º ano!!! Às vezes não sabem sequer somar fracções. Como conseguiram chegar à faculdade, passando nos vários exames, assim??? Só pode ser pelo facilitismo, pela “demagogia da facilidade “, pelas “bizarrias ideológicas” que promovem “alteração radical dos programas, dos métodos, dos currículos, dos manuais, da disciplina” ... “que pretendem fazer do ensino uma festa de prazer e preguiça”, e pela “condenação da disciplina”. Como agravante temos assistido também a “instruções políticas e administrativas dadas por um ou outro ministro...no sentido de aumentar as notas, repescar alunos chumbados, eliminar os exames, facilitar as passagens automáticas e evitar os repetentes” , como disse ANTÓNIO BARRETO.
Eu tenho pena dos actuais alunos do secundário, para quem a matemática que lhes ensinam é um somatório dum número reduzido (para não sobrecarregar o programa) de regras, de que não lhes explicam o significado. Só se pode gostar do que se conhece, do que se compreende. E só se pode ter bons resultados numa disciplina se se gostar da matéria. Tem de se aderir emocionalmente. Eu entusiasmava-me com o desafio que representava ir desenrolando o fio do raciocínio para chegar ao resultado dum problema. Resolver os exercícios num exame de matemática dáva-me gozo. Como resolver uma charada. Como um jogo. Por vezes a professora caminhando enquanto nos explicava entusiasticamente algum encadeamento lógico, não reparava que o estrado tinha acabado e caía dizendo “Ai meninas que lá vou eu!”, mas a verdade é que eu estava tão suspensa das suas palavras que também não reparava onde ela punha os pés. Isto porque tinham a preocupação de nos mostrar o porquê das coisas, o que por vezes encerra uma grande beleza. Tenho a certeza que se conseguissem mostrar aos jovens essa beleza, eles fariam tudo para ficar por dentro do assunto.

Equação de Lorenz

Quase tão difícil como resolver o problema da Educação e do Insucesso Escolar em Portugal, é predizer o tempo que fará daqui a uma semana...

Eduard Lorenz era um meteorologista investigador que acreditava que se soubesse escolher bem o modelo matemático que rege a evolução do tempo poderia fazer previsões metereológicas mais exactas. Assim, depois de muitos ensaios, escolheu como variáveis a temperatura, a pressão e a velocidade do vento, e criou equações que as relaccionavam.
Ele acreditava que assim como um erro mínimo na determinação da posição do cometa Halley em 1910 só causaria um erro mínimo na previsão do seu regresso em 1986, e o erro permaneceria mínimo durante milhões de anos, assim as suas equações poderiam predizer que temperatura e que pressão eatariam num determinado dia.
Os computadores que usou para tratar essas equações mostraram-lhe que não.

Um arco íris

que eu tive a sorte de presenciar e captar, no Papagaio da Serafina, em Lisboa

Epur si Muove!

Foi ao ler o Abrupto, hoje, que reparei que faz hoje 21 anos que João Paulo II cancelou a condenação de Galileu, ocorrida em 1633. Durante trezentos e setenta e um anos, considerou-se que a terra estava no centro do universo. Não estava! Mas era um dogma...

Nem de propósito, depois da conversa sobre a "inércia" e sobre "cumprir os sonhos"!...

Galileu Galilei (1564-1642) foi um físico, matemático e astrónomo italiano, que descobriu a lei dos corpos e enunciou o princípio da inércia. Por pouco Galileo não seguiu a carreira artística. Um dos seus primeiros mestres, d. Orazio Morandi, tentou estimulá-lo a partir da coincidência de datas com Michelângelo (que tinha morrido três dias depois do seu nascimento). O seu pai queria que ele fosse médico, pelo que ele desembarcou no porto de Pisa para seguir essa profissão. Mas era um péssimo aluno e só pensava em fazer experiências físicas (que, na época, era considerada uma ciência de sonhadores).

Aristóteles era o único que havia descoberto algo sobre a Física, ninguém o contestava, até surgir Galileu. Foi nessa época que descobriu como fazer a balança hidrostática, que originaria o relógio de pêndulo. A partir de um folheto construiu a primeira luneta astronómica em Veneza. Fez observações da Via Láctea a partir de 1610 que o levaram a adoptar o sistema de Copérnico. Pressionado pela Igreja, foi para Florença, aonde concluiu com os seus estudos que o Centro Planetário era o Sol e não a Terra, essa girava ao redor dele como todos os planetas. Foi condenado pela inquisição e teve que negar tudo no tribunal. Colocou em discussão muitas idéias do filósofo grego Aristóteles, entre elas o facto de que os corpos pesados caem mais rápidamente que os leves, com a famosa história de que havia subido à torre de Pisa e lançado dois objectos do alto. Essa história nunca foi confirmada, mas Galileu provou que objectos leves e pesados caem com a mesma velocidade. Ao sair do tribunal, disse uma frase célebre: "Epur si Muove!", traduzindo, " e contudo ela (a Terra) move-se! ". Morreu cego e condenado pela Igreja, longe do convívio público. 341 anos após a sua morte, em 1983, a mesma Igreja, revendo o processo,decidiu pela sua absolvição.

Hoje vi o filme “Callas, a diva” e fiquei a pensar no que pode acontecer a uma mulher de 53 anos... Apesar de todo o sucesso que teve, ela quase não conseguiu ultrapassar a dor dum amor falhado. Ela sabia que o Onassis não prestava, mas não conseguia esquecê-lo, apesar de ele já ter morrido, apesar de ele a ter trocado pela Kennedy. Tudo isso a juntar-se ao declíneo da sua voz e da sua carreira, tiraram-lhe o gosto de viver. Enclausurou-se, abandonou os amigos, ... deixou de acreditar em sonhos, quanto mais concretizá-los. Apetecia-lhe deixar-se morrer sozinha.
A propósito disto, vale a pena ler “A pluma caprichosa” da Clara Ferreira Alves, na “Única” do “Expresso” desta semana. Diz ela:
“... a crise económica, a recessão, a depressão, ... atinge mais as mulheres. ... tira-lhes o emprego, o aumento... É mais fácil e mais barato despedir mulheres, e as mulheres são o elo mais fraco, como dizia aquele concurso de televisão que era apresentado por mulheres. A partir de certa idade, muitas mulheres são dispensáveis, pelos maridos, pelos patrões, pelos filhos. ... o país de século XXI não sabe o que fazer com elas... um pouco como os maridos não sabem o que fazer com elas quando arranjam uma mulher mais nova, ou mais bonita, ou mais esperta, ou mais rica. Ou nenhuma destas coisas, quando arranjam simplesmente outra mulher....”
Obviamente que isto não é regra universal. Também há homens abandonados pelas mulheres e homens deprimidos pelo declínio da sua carreira.
Por isso, aquelas palavras de "Holocénico" e de "Um pouco mais de azul", a propósito da coragem e da força para concretizar os sonhos é fundamental. É importante libertarmo-nos dos sonhos vagos, longínquos, difíceis de atingir, que servem de desculpa para ficarmos imóveis. É necessário encontrar força para agir, reconhecer à memória e ao passado o seu papel na construção de um futuro com esperança, mas seguir em frente e viver.

Inércias e sonhos por cumprir

"Activar intenções, vencer a inércia implica esforço, para o qual nem sempre temos forças ou coragem. E por isso muitas realizações se ficam pelos sonhos. Em clausura, a liberdade de sonhar liberta, em liberdade, se não acompanhada de uma força para agir, pode ser uma morfina que nos impede de viver."

"A força da inércia é terrível. A morfina do sonho inalcançável vicia e mata, a pouco e pouco, o entusiasmo, a alegria, a própria capacidade anímica. Estende garras insidiosas que afectam quem está ao lado e, pouco a pouco, se vê enleado numa teia cinzenta, baça, que puxa para o fundo do poço, rouba a energia, faz pensar que nada importa ou vale o esforço. Faz desistir de viver.

São frases de "Holocénico" e de "Um pouco mais de azul" " que me tocaram! Sim, é preciso sonhar, é verdade que o sonho comanda a vida, mas é preciso depois ter a coragem de o concretizar. Dar o arranque inicial, será o mais difícil, mas é essencial...

E porque não ouvir uma música antiga?

E um poema ...

Eu amo tudo o que foi,
Tudo o que já não é,
A dor que já me não dói,
A antiga e errônea fé,
O ontem que dor deixou,
O que deixou alegria
Só porque foi, e voou
E hoje é já outro dia.

de Fernando Pessoa, 1931.

E porque hoje me apetece ver algo bonito para me fazer esquecer tantas coisas tristes que tenho presenciado, aqui vos deixo esta flor:

A propósito da dicotomia Ensino Politécnico / Ensino Universitário, acho que esta foi escrita por quem está por dentro desta problemática...

Beagle falhou devido a peça portuguesa.
O parafuso do Técnico acabou por não estar à altura.

Hoje são histórias para sorrir... tiradas do "Inimigo Público", do jornal "Público". Têm muita graça!!!

A propósito do financiamento da investigação pelo Ministério da Ciência:

"Governo português oferece cérebros a investigadores
que tenham teses de 500 páginas sem ideias originais"

Já que não consigo continuar a comentar o post anterior (caracteres a mais...), continuo aqui.

Não estou convencida que seja uma questão puramente hormonal. Nunca disse isso. Concordo que tem muito de cultural, mas acho que tambem tem muito de hormonal!
É a natureza. Só isso! De facto somos diferentes, homens/mulheres do ponto de vista físico, psicológico, mental e cultural. Mas há uma parte desta diferença, contida na parte cultural, que se tem vindo a alterar ao longo dos tempos. Felizmente, para melhor! Já passou o tempo do homem das cavernas que arrastava a mulher pelos cabelos. Agora a mulher vive mais plenamente, pode usar todas as suas capacidades intelectuais. Pode ombrear com os homens na construção do mundo. E pode dar o seu contributo particular, a sua visão feminina a essa construção. E isso é enriquecedor. Não percebo o medo que alguns homens têm de que as mulheres passem a dominar tudo. Pela parte que me toca, acho que as mulheres não têm qualquer ambição nesses sentido. Querem simplesmente andar de cabeça erguida, ser autênticas em tudo aquilo que fazem, incluindo a profissão. E é aí que darão o seu contributo particular. Acho, por exemplo, que as mulheres têm mais resistência à dor, têm maior capacidade de trabalho, de sacrifício, de doacção de si próprias, do seu tempo, do seu esforço, àqueles de quem gostam.

Inspirada em Um pouco mais de Azul mostro aqui também uns olhos azuis... de quem???

Inspirada em Professorices mostro aqui também o meu mar azul... onde é??? não, não é nenhuma ilha tropical longuínqua... é Lagos, Portugal.
Aqui vemos a pequena praia do Pinhão. Quando a maré está vazia, podemos ir a pé partindo do lado esquerdo da praia da D. Ana. Ou então, descendo directamente a rocha junto à casa do Pinhão.
Ultimamente o rochedo tem-se esboroado um pouco e já nem há bar nesta praia. Há alguns anos, por ser de difícil acesso (muitos degraus) era frequentada apenas por jovens belos e saudáveis.
Eu continuo fã. Em Maio está quase vazia de gente, só o silêncio das ondas e os gritos das gaivotas que perderam o medo de se aproximarem de nós.

Fractais --- a beleza da matemática!

Vale a pena ler o post de Domingo, Maio 02, 2004
A NECESSIDADE DE, E O DIREITO AO, DESCONHECIDO no A Formiga-de-Langton
"Todos nós procuramos um ponto de equilíbrio entre o desconhecido e o conhecido."
"A exigência do desconhecido é tão grande quanto a de comida, isto é, precisamo-lo, não a cada minuto, como o oxigénio, mas a cada dia, como a comida. Tal como a comida podemos passar sem ela durante dias ou semanas, sem que a sua ausência nos mate - ao contrário da água -, ou destrua - o efeito da privação do sono -, mas definharemos lentamente."

Eu diria mais: o desconhecido atrai-nos como um abismo. Fascina-nos na tentativa de o decifrarmos, mas por vezes pode-nos ser fatal! Daí ser necessário um certo comedimento, tentar manter um certo equilíbrio...

"- A necessidade do desconhecido é grosseiramente subestimada e mesmo reprimida."
Incrivelmente verdade! Reconheço que fugi a sete pés de prosseguir na senda de um certo desconhecido... porque não estava a conseguir processar toda a informação que estava a receber!

Desculpem, só mais este e depois vou dormir.. anoitece, e é preciso partir!
..e estas mãos noturnas onde aperto os meus dias quebrados na cintura...

As Palavras Interditas

Os navios existem e existe o teu rosto
encostado ao rosto dos navios.
Sem nenhum destino flutuam nas cidades,
partem no vento, regressam nos rios.
Na areia branca, onde o tempo começa,
uma criança passa de costas para o mar.
Anoitece. Não há dúvida, anoitece.
É preciso partir, é preciso ficar.

Os hospitais cobrem-se de cinza.
Ondas de sombra quebram nas esquinas.
Amo-te... E abrem-se janelas
mostrando a brancura das cortinas.

As palavras que te envio são interditas
até, meu amor, pelo halo das searas;
se alguma regressasse, nem já reconhecia
o teu nome nas minhas curvas claras.

Dói-me esta água, este ar que se respira,
dói-me esta solidão de pedra escura,
e estas mãos noturnas onde aperto
os meus dias quebrados na cintura.

E a noite cresce apaixonadamente.
Nas suas margens vivas, desenhadas,
cada homem tem apenas para dar
um horizonte de cidades bombardeadas.

por Eugénio de Andrade
(lembras-te que te enganaste, deste-me Maria Teresa Horta (embrulhada)..., dizendo que era Eugénio de Andrade...:)))) - são palavras interditas ... que não me reconheceriam ... se voltassem!

Passar pelos blogs forum comunitario e um pouco mais de azul , sugeriu-me estes poemas de Eugénio de Andrade:

As Mãos e os Frutos

Passamos pelas coisas sem as ver,
gastos, como animais envelhecidos:
se alguém chama por nós não respondemos,
se alguém nos pede amor não estremecemos,
como frutos de sombra sem sabor,
vamos caindo ao chão, apodrecidos.





A minha mão...



Canção

Tu eras neve.
Branca neve acariciada.
Lágrima e jasmim
no limiar da madrugada.
Tu eras água.
Água do mar se te beijava.
Alta torre, alma, navio,
adeus que não começa nem acaba.

Eras o fruto
nos meus dedos a tremer.
Podíamos cantar
ou voar, podíamos morrer.

Mas do nome
que maio decorou,
nem a cor
nem o gosto me ficou.

Vale a pena ver este site sobre a política de financiamento da investigação do MCES.
Contributos sobre a proposta do MCES do Modelo de Financiamento do Sistema de Ciência, Tecnologia e Inovação
http://www.math.is.utl.pt/financiamento.phtml

Alguns excertos:

"Há uma vasta literatura sobre boas-práticas de avaliação científica e critérios para financiamento de centros e institutos de investigação, bem como sobre os defeitos da aplicação automática de indicadores quantitativos, incluindo bibliométricos.
A ignorância desta literatura demonstrada no novo modelo de financiamento de unidades de I&D anunciado pelo Ministério da Ciência e do Ensino Superior (MCES) em 13.04.2004, é reveladora de reduzido conhecimento do assunto, amadorismo e simples falta de curiosidade de quem o preparou, o que em si mesmo, demonstra uma atitude anti-científica...."

"Para a matemática, em Portugal e no Mundo pode ser muito mais significativa a contribuição de um único artigo em cinco anos, por exemplo, no Annals of Mathematics do que quinze artigos publicados noutras revistas"

"O modelo proposto deixaria fora de elite dos "excelentes" cerca de metade dos Medalhas Fields..." (o equivalente ao Prémio Nobel para a matemática)